CORRUPÇÃO: O DIABO PODE NÃO SER TÃO FEIO QUANTO O PINTAM

Outro dia, numa conversa com uma pessoa pela qual tenho enorme apreço ele me disse: “o maior problema do Brasil é a corrupção”. Inicialmente, dada à efetividade da, digamos, ideológica propaganda difundida de forma maciça e a quatro cantos pelo sistema capitalista e pela mídia por ele sustentada, somos tentados a crer na assertiva como verdade absoluta sem questioná-la, por um segundo sequer. Ocorre, entretanto, como no dito popular, “o buraco é mais em baixo”. Que fique claro, desde logo, que nossa intenção não é perfumar ou glorificar a corrupção. Ela é, sem sombra de dúvida, uma mazela perversa que traz consequências terríveis para a sociedade brasileira, quase que exclusivamente para a parcela mais pobre, que sofre na pele as omissões do estado que dela decorrem.

O Brasil é sem dúvida um país com grande número de corruptos, sim, é verdade e ela foi posta à mostra num movimento jurídico/político que começou com a Operação Lava Jato, cujo mérito foi trazer à tona práticas criminosas longevas e que quase a totalidade dos partidos políticos do Brasil estava metida até o pescoço, com exceção, salvo engano, do PSOL, PSTU e PCO. Os grandes partidos, todos eles foram citados, sem exceção. Lamentavelmente, o remédio da lava Jato foi em dose alta demais, a operação talvez tenha extrapolado no tempo e o que era remédio passou a ser veneno. Houve uma quebradeira das grandes empresas da engenharia nacional e com ela milhares de postos de trabalho viraram pó, tributos deixaram de ser recolhidos e divisas para o Brasil deixaram de entrar, neste caso porque as grandes empresas nacionais também eram grandes no exterior. Um detalhe crucial não foi observado: havia que se punir as pessoas, mas sem destruir as empresas. A vaidade extrema dos procuradores responsáveis pela condução dos procedimentos fez da Operação tanto palco como espelho, ora para se exibirem publicamente, sempre de forma superlativa, ora para admirarem a si mesmos, como foi o caso do procurador Dalagnol, que chegou ao ponto de enviar mensagens a si mesmo (isso mesmo, ele se comunicava com ele mesmo), possivelmente a forma encontrada de materializar suas reflexões com seu alter ego e lustrar seu exacerbado narcisismo.

Voltando ao nosso tema corrupção, caso o Brasil não tivesse 6.329 favelas, que impõem mais de 11 milhões de pessoas a condições extremamente precárias de moradia, onde se inclui, entre outras precariedades, a precariedade na educação, a falta absoluta de água tratada e zero de saneamento, estaria ela num patamar hierarquicamente superior, mas não é o caso. Com efeito, vale lembrar que só no Rio de Janeiro existem 763 favelas, ou seja, 22% da população da Cidade Maravilhosa, segundo dados do IBGE obtidos no censo de 2010. Destaque-se que o censo do IBGE é a tomografia do estado brasileiro, pois nele os tumores são detectados. Lamentavelmente o atual governo deu ao censo tratamento de segunda classe. Sem fugir do tema, mas apenas com o intuito de inserir um dado a mais no contexto, o ministro de economia Paulo Guedes disse em entrevista sobre o censo, à Globo News, que “O Brasil é um país pobre e faz 360 perguntas. Custa muito caro e tem muita coisa do nosso ponto de vista (do governo federal) que não é tão importante”. Pois bem, além de tentar desqualificar um valioso instrumento que visualiza com precisão o estado brasileiro, que por sua vez assegura a adoção de políticas públicas adequadas e justas, também mostrou desconhecer o formato do censo. O censo brasileiro tem 150 questões. Errou o ministro na forma e no conteúdo. Mas isso não é à toa, claro.

Além das favelas, que nesta hierarquia já coloca a corrupção em segundo lugar, há, também, o grave problema da saúde pública, que a empurra para o terceiro lugar. Se considerarmos a capacidade de entrega que os entes federativos têm do bem entendido com saúde, direito fundamental inserto na Constituição, a capacidade instalada de equipamentos para atendimento das pessoas pobres e da classe média, que se encontra numa descendente de empobrecimento, não dá conta de uma demanda que cresce a cada dia. Neste sentido, segundo estudos realizados, neste momento de plena transição demográfica brasileira, motivada pelo acelerado crescimento em razão do declínio da mortalidade e taxa de fecundidade horizontalizada em patamares altos, entre 1999 e 2009, a população cresceu em mais 27,5 milhões de habitantes com redução de 26,7% dos leitos e 947 mil internações com distorções na distribuição por clínicas.

No município do Rio de Janeiro, segundo levantamento realizado pela Comissão de Saúde da Câmara dos Vereadores, em matéria publicada no G1, mostrou que, em um ano, a capacidade de atendimento da rede de saúde da família do Rio caiu 17%. A cobertura desta modalidade de atendimento na cidade, segundo o estudo, caiu de 70% para 53%. Na Rocinha, maior favela da cidade do Rio de Janeiro, com cem mil habitantes, segundo o censo das favelas realizado pelo governo do estado, houve redução no número de profissionais que atendem os moradores nas três clínicas da família existentes.

Não bastassem as mazelas da precariedade de moradia e saúde, há o gravíssimo problema da violência, tema que, devido à grandeza e complexidade, trataremos num outro momento.

Apenas considerando esses três problemas a corrupção se situaria em quarto lugar na hierarquia dos males que assolam a sociedade brasileira. Ora, por que então há uma tendência em ascender a corrupção ao primeiro lugar das mazelas nacionais? Tal qual a religião, que tem um papel de relevada importância para o estado no controle das massas, a massificada informação de que a corrupção é o mal maior do Estado cria uma cortina de fumaça para outros problemas, e permite avanços de uma agenda normalmente contrária aos interesses do grosso da população mais pobre.

A informação, geralmente apresentada com todos os requintes da psicologia aplicada ao marketing, com imagens, cores, vozes e expressões faciais dos apresentadores cumprem eficazmente o papel de inserir a corrupção no topo da “cadeia alimentar”. Incutida no subconsciente das pessoas, a mensagem se propaga a ponto de cegar e ensurdecer as pessoas para as grandes mazelas e deixar o caminho livre para, a pretexto do combate à corrupção, a implantação da agenda liberal e derrubada dos direitos da classe trabalhadora.

Sedimentada a “verdade”, propício o ambiente para deposição de uma presidente eleita sob o frágil argumento legal de cometimento de crime de responsabilidade. A questão era política, convenhamos.

Deposto o governo, aprovou-se a reforma trabalhista que fragilizou ao limite máximo as relações de trabalho, derrubou conquista que levaram décadas e décadas para serem conquistadas pelos trabalhadores, sem prejuízo de amputar as pernas do único instrumento de luta e representatividade dos trabalhadores: os sindicatos. A única forma de financiamento dessas entidades foi simplesmente extirpada. Sem dinheiro, sem sindicatos; sem sindicatos, sem voz e sem direitos.

Vencida a etapa da reforma trabalhista, cujo objetivo era de criar um modelo econômico todo voltado para o capital e habilmente conduzida pelo presidente da câmara Rodrigo Maia, avançou-se em direção à reforma previdenciária, que embora combatida ao limite da exaustão pelos representantes dos trabalhadores na câmara e no senado, por associações de trabalhadores e sindicatos, inclua-se o sindicato dos auditores fiscais da receita federal, SINSFISCO, e a associação dos magistrados da justiça do trabalho, ANAMATRA, a reforma foi aprovada e sonho da aposentadoria para os mais pobres passou a ser praticamente inalcançável, tendo em vista ser o Brasil um país com enorme nível de informalidade nas relações de trabalho, o que dificulta comprovação das contribuições mínimas necessárias para aposentadoria.

Mesmo aprovada a reforma, ainda assim o tema corrupção deveria continuar no radar do establishment, pois a agenda liberal necessitava avançar ainda mais e os holofotes se voltaram para as reformas administrativa (leia-se corte de benefícios e perseguição aos empregados e servidores públicos), tributária e política.

No curso do processo de avanço havia um evento político da maior importância: as eleições majoritárias para a presidência da república, da câmara dos deputados e do senado. O candidato representante das classes populares surfava imbatível nas pesquisas e, para a garantia do sucesso da agenda liberal, deveria ser batido a qualquer custo. A Operação Lava Jato foi um valioso instrumento nessa tarefa, onde, inclusive, além da cobertura maciça da mídia sobre os procuradores, das prisões espetaculares da polícia federal, surgiu um juiz federal de Curitiba que serviu aos desígnios do  establishment e logo alçado à condição de herói nacional. Portanto, tarefa cumprida, a marcha do liberalismo estava madura para seguir seu rumo. Ressalte-se que tempos depois a atuação do juiz, a essa altura a serviço do governo que ajudara a eleger, teve sua atuação questionada pela imprensa sob o forte argumento da parcialidade nos julgamentos, maior pecado que pode ser cometido pelo poder judiciário.

Outro problema extremamente grave que assola o cotidiano da sociedade brasileira é a violência (inclusive a policial), a qual, pela grandeza e complexidade, será objeto de artigo independente. No entanto, segundo nossa hierarquia, já empurra para um patamar ainda mais abaixo o tema corrupção.

O diabo da corrupção é feio, sim, mas a depender do poder de turno é mais feio do que é pintado..

Adm Reginaldo Oliveira é Conselheiro do CRA-RJ e Diretor do SINAERJ

Lava Jato atingiu membros de 33 partidos; duas siglas não foram implicadas

https://istoe.com.br/183856_IBGE+6+DA+POPULACAO+BRASILEIRA+MORA+EM+FAVELAS/

https://pt.wikipedia.org/wiki/Favelas_na_cidade_do_Rio_de_Janeiro

https://reinaldoazevedo.blogosfera.uol.com.br/2019/09/04/o-postulante-ao-senado-que-se-compara-a-cristo-e-julga-ouvir-a-voz-de-deus/

https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2019/11/08/capacidade-de-atendimento-da-rede-de-saude-do-rio-caiu-17percent-em-um-ano-aponta-estudo.ghtml

https://www.conjur.com.br/2017-out-09/juizes-ministros-discutem-nao-aplicar-reforma-trabalhista

https://brasil.elpais.com/brasil/2019/05/13/politica/1557776028_131882.html

Sobre letras e algarismos

Artigo escrito em Abril de 2013

Sempre preferi as letras aos algarismos. Com o perdão dos matemáticos, o agrupamento de letras me agrada mais que o agrupamento de algarismos. Tributos são algarismos, poesias são letras, e por aí vai. Alguém seria capaz de imaginar o mestre Caetano ou o saudoso Drumond mexendo com algarismos ao invés de letras? Jamais vi alguém cantando uma milhar ou recitando uma centena naquele projeto Seis e Meia do João Caetano, alguém se lembra? O que víamos ali eram letras musicais que nos faziam chegar mais leve em casa, nos faziam mais felizes. Os tempos eram outros.

Posso até dizer que conheço casos de extrema emoção diante de certos agrupamentos de algarismos, o exemplo clássico é quando da abertura do contra-cheque no final do mês (como tem gente que chora…Que o digam as torcidas do Flamengo, do Corinthians, do Vasco, Palmeiras, Santos…Ufa!), Confesso que no meu caso em particular tenho me esforçado para conter as lágrimas.

Um outro caso relativo a algarismo, intrinsecamente ligado ao primeiro, o qual tem me causado problemas, é a perseguição que tenho sofrido de um facínora conhecido como Sr. Zero, mais conhecido como Nada. Esse malfeitor vem me perseguindo há anos e aparece sempre na minha data-base travestido de reposição salarial (sou empregado do Estado). A perseguição implacável já dura mais de dez anos e o danado vem resistindo até aos meus patuás. Oxalá ano que vem esse cálice se afastará de mim.

Continuando sobre os algarismos, alguns outros também têm tido a capacidade de me despertar para alguns sentimentos. Quando vi na TV o nosso velho conhecido Maurício Marinho embolsando R$ 3.000,00, fiquei indignado ao assistir àquela feira (olha o sentimento aí). Depois que outros personagens foram aparecendo (já tem até gente comentando do poderoso Palocci, será?) percebi que três mil eram uma verdadeira merreca, um trocado, um troco perto dos Bis que já andam falando estarem depositados nos paraísos fiscais.

Tenho tido o cuidado para frear os meus “sentimentos mais primitivos” , num plágio ao loquaz deputado Roberto Jéferson, quando vejo alguns marginais (se andaram à margem da lei me sinto autorizado a qualificá-los assim) dissecarem algarismos tão expressivos que sangraram a economia do nosso povo. Vivo me policiando quanto aos sentimentos ruins que a eles poderia direcionar, mas, lamentavelmente, volta e meia sinto um “gostinho de sangue” na boca, sou humano. Quanto à perplexidade e à indignação, alimento-as dia-a-dia com novas notícias, pois esses sentimentos me afastam do conformismo e da sensação de que essa seja a regra. Algo tem de acontecer!

Para finalizar, fazendo finalmente um afago nos algarismos, gostaria de sugerir a algum poeta que recitasse, quem sabe num ressuscitado projeto vespertino como aquele do João Caetano, pausada e melodiosamente, os algarismos referentes aos anos de cadeia que desejamos a alguns bandidos pelo manuseio indevido dos nossos queridos algarismos públicos. Confesso que ficaria emocionado!

Adm Reginaldo Oliveira

Empresa Jr. Unijui

Da Universidade para a vida

Logo que iniciei os estudos, na Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul, popularmente conhecida como Unijuí, confesso que não sabia ao certo o que estava buscando, sabia da necessidade de buscar pelo conhecimento, pelo estudo, isto sim, mas a certeza do que exatamente buscava não fazia parte dos meus pensamentos, na época.

Tão real este sentimento que, lembro-me em uma noite em sala, a professora instigou-nos a falar sobre as motivações pela escolha do curso, em um tom um pouco descontraído, lembro-me de ter dito: “não sei certo o curso que gostaria de realizar e então por este motivo escolhi Administração.”

Esta experiência ficou na memória, dando lugar para outras novas e desafiadoras, da vida acadêmica, e do curso escolhido. Um mix de sentimentos e novas sensações por romper barreiras, por entender o processo, o surgimento da história administrativa, das grandes mentes brilhantes e seus tão conceituados livros, servindo como “bíblia” não apenas como referências bibliográficas, entender o processo do pensador, é fundamental para o crescimento, tanto de nós mero indivíduos quanto em sociedade.

Uma das experiências mais marcantes da minha vida acadêmica, teve início em 2015, como voluntária na Empresa Jrº, tive a oportunidade de fazer parte da equipe como Presidente, no ano seguinte. Foram experiências de trabalho, de consultoria, aplicação de questionários, pesquisa de mercado, tabulação, a importância dos dados e das relações tornaram-se mais essenciais que já estavam. Formamos um time muito bacana, com camisetas personalizadas, com registro de ata das reuniões, com previsões de tarefas, e por vezes não conseguíamos dar conta da demanda trazida. Os contatos eram feitos pelo público externo na Universidade, que entrava em contato conosco explicando a necessidade, o próximo passo era marcarmos uma reunião para troca de ideias, sempre em conjunto de um professor que nos auxiliava, dando suporte e credibilidade.

Com a crescente aceleração tecnológica, está mudando a maneira de composição das empresas, inclusive as novas formas de reuniões, a organização dos processos ajudou muito na minha visão empresarial. Organizamos eventos acadêmicos, e de certa forma posso dizer por todos do grupo, sentíamos importantes em representar a Universidade, um estágio dentro da própria Universidade.

Todos os estudantes, independente do curso, mas principalmente futuros Bacharéis de Administração deveriam passar pela experiência que passei, deveriam buscar novas formas de aprender, de se inserir, de arriscar, inclusive em eventos que não sejam específicos da sua área de atuação, aumenta sua visão e o fato de você sair da caixinha já vale a pena, e muito.

Hoje quase me formando, felicíssima na área e profissão que escolhi, não me vejo em outro lugar, administração tem em tudo, é essencial para a empresa, seja pequena, média ou grande, podendo ser Microempresário Individual ou concursado, não importa, importa a forma como você se reinventa, como aproveita as oportunidades que a vida lhe dá, isso vai deixar você mais fraco ou mais forte.

Equipe da Empresa Junior

Contribuição de:
Karla Letícia Morais da Silva
Estudante 7º semestre de Bacharel em Administração
Unijuí

Inovação! E inovação “à moda Chinesa”.

Recentemente estive em Beijing para participar de uma conferência internacional sobre Inovação e apresentar um artigo sobre ecossistemas de empreendedorismo-intensivo em conhecimento. A conferência foi realizada na Escola de Economia e Negócios da Universidade de Tsinghua, considerada a MIT Chinesa e posicionada em 22º lugar no Ranking das melhores Universidades do mundo.

A conferência foi organizada pela “Industrial and Corporate Change”, uma revista internacional com foco em economia e inovação cujo corpo editorial é formado por lideranças do pensamento em das melhores universidades do mundo.  O corpo editorial é formado pelo que poderíamos chamar de “discípulos” de Joseph Schumpeter (“O Profeta da Inovação”), economista austríaco que compreendeu, há 100 anos atrás, a papel fundamental da inovação como propulsor do desenvolvimento econômico e previu a dinâmica e ritmo do desenvolvimento capitalista que estamos vivendo hoje.

Portanto, o principal interesse desse grupo de acadêmicos é compreender como economia e tecnologia interagem para produzir mudança na dinâmica das empresas, setores e quais as implicações desse processo para a geração de riqueza nos diferentes países visando, eventualmente, contribuir para estratégias e políticas que fomentem a inovação.

O mundo é repleto de evidências de que o diagnóstico e previsão de Schumpeter estavam corretos, o que tem justificado o esforço de diferentes países em promover políticas que visam a inovação. Se, de um lado, a inovação explica a posição de liderança de países desenvolvidos (EUA, Alemanha, Inglaterra, Finlândia, etc), por outro também explica a ascensão de outros como, por exemplo, Japão, Coréia do Sul, Singapura e Israel. O caso mais recente e emblemático das últimas duas décadas é o Chinês.

Inovação à moda Chinesa – Breve Histórico

Embora a China tenha um histórico milenar de inovações que remontam a invenção do papel, da seda, pólvora, fogos de artifício, entre o outros, a evolução recente do século do final do século XX e início do século XXI tem sido assistida pelo mundo. Em resumo, a partir de 1979, o país iniciou um processo de abertura para investimento externo, liberalização (ou “descoletivização”) da economia interna dando lugar ao empreendedorismo e abertura de novos negócios e modernização da economia com foco em quatros setores: agricultura, indústria, defesa e ciência e tecnologia. Em 2001, a China ingressa como membro na Organização Mundial do Comércio (OMC) o que intensifica a abertura e internacionalização do país. Desde então, o país tem obtido um crescimento quase exponencial em diferentes setores da sociedade. Os incentivos econômicos de uma competição por baixo custo orientado a exportações, levaram a um processo investimento estrangeiro direto em diferentes setores industriais, em infraestrutura, e migração do campo para a cidade, ou seja, uma verdadeira “sino-revolução industrial” 240 anos após a primeira (ocorrida na Inglaterra), fizeram com que a China se tornasse a “fábrica do mundo”.

A “mágica” econômica promovida por uma política agressiva de desvalorização cambial, se consolidou no espantoso crescimento do PIB e “catching up” ou convergência econômica que podemos observar no gráfico dinâmico que viralizou recentemente.

No entanto, a convergência econômica é, antes de tudo, resultado de uma convergência tecnológica uma vez que os fluxos industriais trouxeram consigo fluxos de conhecimentos e capacidades tecnológicas que não existiam no pais anteriormente. É justamente essa diversidade conhecimentos que permitem uma série de “novas combinações” de hardware, software, “bioware” e serviços com aplicações de valor para o mercado que tem alçado o país para figurar entre as nações mais inovadoras do mundo.

Essa evolução pode ser observada também nos relatórios do Global Innovation Index desde 2012 (Figura 1) em que a China claramente salta do grupo de países de renda média caracterizado por pouco inovação e pouco desenvolvimento econômico e começa a integrar o grupo de países desenvolvidos.

Figura. 1. Global Innovation Index vs GDP Per Capita in PPP$ (bubbles sized by population)

FONTE: construído a partir de Dutta et al (2012, 2018)

Qual o limite para a inovação?

Quando países se aproximam do ponto de convergência tecnológica e econômica de países desenvolvidos, o único passo possível para a evolução está no avanço da fronteira científica. E essa foi a tônica das apresentações dos pesquisadores Chineses presentes na Conferência em Beijing. Poderá a China se tornar a principal potência em Inovação?

O recente desenvolvimento chinês seguiu uma conhecida e documentada estratégia “da Imitação para a Inovação” semelhante ao processo Japonês e Sul Coreano em décadas anteriores. À medida que esse modelo se esgota, os países precisam buscar a consolidação não apenas de suas empresas por meio de produtos de maior qualidade e marca, mas também a liderança na resolução de problemas complexos que estão na fronteira do conhecimento. Isso se dá através de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), em especial, pesquisa básica.

Ao analisarmos os gastos nominais em Pesquisa e Desenvolvimento, a China vem se aproximando a passos largos dos Estados Unidos (Figura 2). No entanto, o volume de recursos não nos informa sobre a qualidade ou prioridades dessa alocação. A figura 3 apresenta essa orientação. A maior parte dos gastos em P&D na China se dão no nível de pesquisa experimental e aplicado (aquele voltado a resolução de problemas de produção ou engenharia) que não lidam especificamente com os desafios da fronteira do conhecimento.

Figura 2. Gastos Nominais em P&D

Fonte: OECD – https://data.oecd.org/rd/gross-domestic-spending-on-r-d.htm#indicator-chart

Figura 3. Gastos por tipo de pesquisa

Fonte: OECD – https://data.oecd.org/rd/gross-domestic-spending-on-r-d.htm#indicator-chart

A influência científica do país pode ser medida pela produção e publicação de pesquisas bem como patentes e suas o número de citações dessas produções no âmbito global. Embora o número de publicações tenha aumentado significativamente, a qualidade das publicações assim como das patentes publicadas é muitas vezes questionada. Argumenta-se que, embora a China esteja posicionada como segundo lugar no número de publicações, a média de citações por documento ainda é baixo o denota uma relativa pouca influência na comunidade científica internacional se comparada com os principais líderes como Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha e França. No entanto, não será surpresa ver essa condição melhorar nos próximos anos.

Figura 4. Publications

Fonte: https://www.scimagojr.com/countryrank.php?order=it&ord=desc

Cabe ressaltar, no entanto, que o tipo de P&D Chinês é plenamente coerente com uma estratégia bem-sucedida de aquisição de conhecimento externo e catching up realizados até aqui. Nesse sentido, apesar do otimismo e confiança pelo desempenho recente, os Chineses tem plena consciência de que a liderança científica que vem através do investimento em “pesquisa básica” (na fronteira do conhecimento) é uma necessidade tanto para sustentar o crescimento quanto para colocar o país em uma posição de liderança competitiva. Essa consciência é o primeiro passo para que o país alcance esse objetivo.

China hoje, futuro e lições para o Brasil

A China tem como objetivo se tornar uma sociedade orientada para a inovação até 2020 e uma superpotência em ciência e tecnologia até 2050.  Para tanto, o país se vale de uma série de planos para realizar a transição de uma econômica orientada a exportação de produtos manufatureiros para aumentar os investimentos em educação nas áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharias e Matemáticas (da sigla STEM em inglês) bem como nas estruturas de suporte e habitats como Parques Tecnológicos e centros de inovação de alta tecnologia como a TusPark (Tsinghua University Science Park).

Algumas coisas saltam aos olhos e que dão um pouco da sensação da evolução do país com um todo.

  • Infraestrutura e transporte da cidade já podem ser considerados de uma país desenvolvido. Apesar do trânsito um tanto quanto confuso, existem amplas rodovias, limpeza das calçadas e ótimo transporte público como linhas de metro que alcançam toda a cidade são simples para utilizar mesmo para estrangeiros. A estrutura de ferrovias para transporte de passageiros expandiu expressivamente nos últimos 20. A capacitação técnica para transporte ferroviário resultaram em um ambicioso projeto de construção de um trem supersônico.
  • Segurança. A sensação de segurança é total. Um possível razão seja o número de extensivo de câmeras de segurança por todos os cantos da cidade e uso controverso de tecnologias de reconhecimento facial.
  • Meio ambiente. O país tem buscando soluções para o combate a poluição do ar oriundos da forte industrialização através do desenvolvimento de tecnologia. Porém chama a atenção a quantidade de espaços verdes e parques no meio da cidade. Além de tornar as cidade mais agradáveis, a campanha também tem contribuído deixar o planeta mais verde.
  • Robótica. Quando menos se espera, é possível ser surpreendido pela tecnologia. No hotel Park Plaza Science Park, se você fizer um pedido a recepção, provavelmente será atendido por um robô que fará a entrega pra você.
  • Tecnologia e comunicação. Talvez o primeiro impacto a ser sentido ao chegar na China é o não acesso às ferramentas de comunicação e redes sociais que utilizamos diariamente (Google, gmail, facebook/instagram, twitter, uber, whatsapp, etc).  Isso denota um país que é aberto para receber conhecimento e tecnologia externo, porém que promove forte reserva de mercado.

Ao andar por Beijing é possível observar um misto de tradição com modernidade. Surpreende a velocidade com que a transformação do país ocorreu, o que nos faz refletir sobre lições que podem e devem ser tiradas para o desenvolvimento do Brasil. Apesar do nosso ambiente de inovação ter melhorado nos últimos anos a partir de uma maior consciência sobre a importância da inovação, do crescente interesse em empreendedorismo e de um nascente mercado venture capital, alguns elementos do ecossistema brasileiro ainda precisam ser aperfeiçoados. Um exemplo são os “links” entre ciência, tecnologia e indústria e um melhor balanço entre pesquisa básica e aplicada. Se na China, a maior parte do investimento em P&D se concentra em pesquisa experimental e aplicada nas empresas (necessárias para a construção de capacidades tecnológicas da indústria), no Brasil, P&D ainda é quase que exclusividade de poucas grandes empresas ou da Universidade cujo foco é, primordialmente, pesquisa básica (não necessariamente atrelados à resolução de problemas imediatos das empresas). Não é o caso de escolher entre uma coisa ou outra, mas de encontrar um balanceamento dessas atividades e seu financiamento ao longo do ciclo completo de inovação.

Referências

Abramovitz, M. (1986). Catching up, forging ahead, and falling behind. The Journal of Economic History, 46(2), 385-406.

Appelbaum, R. P., Cao, C., Han, X., Parker, R., & Simon, D. (2018). Innovation in China: challenging the global science and technology system. John Wiley & Sons.

Dutta, S. (2012). The global innovation index 2012. Stronger innovation linkages for global.

Dutta, S., Reynoso, R. E., Garanasvili, A., Saxena, K., Lanvin, B., Wunsch-Vincent, S., … & Guadagno, F. (2018). The global innovation index 2018: Energizing the World with Innovation. Global Innovation Index 2018, 1.

Kim, L. (1997). Imitation to innovation: The dynamics of Korea’s technological learning. Harvard Business Press.

Lee, K., & Lim, C. (2001). Technological regimes, catching-up and leapfrogging: findings from the Korean industries. Research policy, 30(3), 459-483.

Normile, D. (2018). China narrows US lead in R&D spending. Science. 362(6412), 276.

Pisano, G. P., & Shih, W. C. (2012). Producing prosperity: Why America needs a manufacturing renaissance. Harvard Business Press.

Schumpeter, J. A. (1912). 1934. The theory of economic development.

Yuqing, X. I. N. G. (2006). Why is China so attractive for FDI? The role of exchange rates. China Economic Review, 17(2), 198-209.

Yip, G. S., & McKern, B. (2016). China’s next strategic advantage: From imitation to innovation. MIT Press.

Can China become a scientific superpower?. The Economist. Available at: https://www.economist.com/science-and-technology/2019/01/12/can-china-become-a-scientific-superpower


André Cherubini Alves

Centro de Inovação FGV EAESP

andre.cherubini@fgv.br

Artigo publicado com autorização do autor.
Publicado originalmente na Newsletter da EA Alumni UFRGS.
https://www.ufrgs.br/alumni-ea/?p=360&fbclid=IwAR0XhHmdox6913ntRVDLxS7YL1bPxTmdnXBgRYF-m1uFxvT1aYlGsOORZuM